Revisor
É uma dessas "bocas" incansáveis que todos desejamos calar.
Um estereótipo de autoridade enraizado ao longo dos séculos nas sociedades: o irrepreensÃvel bigode, a imaculada farda, o andar determinado, a postura de braços - cowboy em permanente duelo com os passageiros, a virilidade com que empunha o obliterador de bilhetes (a "arma") , tudo temperado com arrogância a rodos.
A entrada do revisor agita o filme, desequilibra a monotonia que o vaivém do comboio e a paisagem bucólica tendem a instalar.
A confusão que gera com o bilhete de Jonas força os passageiros a dialogarem, a assumirem posições, a exporem-se.
O revisor não teme gatunos ou bandidos. Nem sequer assassinos. Muito menos essas "americanices" modernas dos "cerealquileres".
Quando lhe cheira a esturro, telefona da próxima estação para uma esquadra e fazem-lhe uma "espera". Se for preciso também põe o assassino de molho com a chave inglesa.
Infelizmente, o Revisor nunca pressentirá nenhum assassino.
Provavelmente até já lhe picou algum bilhete, mas está tão seguro de si que quando chegar a sua vez lhe caiam os bigodes.
O revisor "fala pelas costas", enfia-se pelo colarinho dentro, desaparece em bicos dos pés, regressa furtivo, resmunga o horário amargo que não sabia de cor e volta a desaparecer incapaz de pedir desculpa. Os revisores deste mundo não pedem desculpa. Por isso, o contributo para a universalidade de "A Suspeita" é enorme, apesar de o filme ser tão genuinamente português.